1/27/2017
A vida é uma máquina de lavar a roupa
Passado uns anos, entope uma vez ou outra, faz um bocadinho de barulho, mas carregas nuns botões e mexes nuns fios e aquilo volta ao normal e sentes-te muito macho porque arranjaste cenas e sentes que tudo dependo do teu trabalho intenso. Como na vida, vão acontecendo alguns percalços, mas com uma discussão ou outra, uma ideia ou iniciativa e resolves os berbicachos do dia a dia.
Depois, há um certo dia, em que a máquina começa a avisar que nada está bem. Um erro F18, depois um F19, a porta que bloqueia, uma inundação na cozinha, e dás por ti deitado numa poça em casa, a pedir um rim novo e a ficares com a mão presa no filtro que nem sabias onde estava. Pedes ajuda profissional porque já não consegues fingir que sabes arranjar a coisa, só que custa o preço duma máquina nova e não te garantem que fica a funcionar. Como na vida, nada corre como planeado e quando pensas que já passaste por tudo, lá vem mais um problema e que vais precisar de ajuda profissional para resolver.
A vida é assim, resolves e andas para a frente, apanhas as pedras e fazes um castelo como diz o outro.
O problema desses poetas é que não tinham 6 pessoas de caganeira na mesma casa, roupa de uma semana por lavar, uma cadela que larga mais pelo do que tem, o que é impossível mas acontece, e uma mistura de necessidades humanas divididas por 6 pessoas todas diferentes e com feitios diferentes e reivindicações diferentes e coisas que te fazem querer fugir e voltar uma semana depois. Uns acordam às 6, outros as 7 e outros às 8. Uns têm fralda, outros não têm mas deviam ter. Uns escolhem roupa outros estão a roubar comida. Uma epopeia romântica mas dantesca que é a vida familiar.
Foi então que descobri as lavandarias automáticas. Tem wi-fi gratuito, conversa de bairro que tanto gosto, café ao lado, uma mesa para trabalhar, e uma paz que poucas pessoas percebem. Como na vida, há que saber que algumas vezes, em vez de enfrentar um problema, tem que arranjar uma razão para ir dar uma volta e arejar.
As pessoas pensam que os electrodomésticas são maquinas impessoais, mas se olharmos bem são lições de vida. E neste momento a minha vida é uma máquina de lavar a roupa.
1/25/2017
tão natural como a sua sede ou só o melhor da vida
Ainda que com idades diferentes eles são referências uns para os outros, exactamente como devia ser. E procuram uns nos outros o que vão precisando (e o que são): calma, descargas, mimos, gostos e crescimento. E eu babo-me de ver.
tem de ser isto o melhor da vida, tem de pelo menos fazer parte da lista dos top.
1/18/2017
ele não chora, berra
1/16/2017
Filhos internados ou bebes no hospital, devia ser proibido
1/11/2017
Como começar a escrever tudo sem que seja confuso?
Como começar a escrever tudo sem que seja confuso? Não sei, até eu estou muito confusa...confusa na medida em que as pessoas que fazem verdadeiramente voluntariado falam sempre da situação de nos prepararmos bem psicologicamente porque depois a dita aterragem é difícil, é sempre, eu sei, mas cada um reage de forma diferente e por mais que se faça várias vezes, essa aterragem vai sempre ser diferente. Por isso não sei como me preparar, nunca soube, mas o que faço e tento muito, é ir com noção de que independentemente de tudo, vou dar e dar, vou facilitar o que está a complicar, vou estar só.
E foi o que tentei fazer nestas férias de família em salamanca, onde estivemos a viver em familia, que em vez de 6, fomos o dobro ou o triplo. Desses, dos dobro ou triplo, vi muitos e dei-me, entreguei-me a todos, mas houve um que me entreguei naturalmente, chama-se Sebas.
Lembro-me que ao prncipio tentava comunicar e meter-me com o sebas, mas eu passava-lhe ao lado e só pensava, "este sacana que tanto quero conhecer, nem olha para mim", depois lá me foi falando, disse-lhe que gostava do Barcelona, riu-se e foi-se embora. Nem sei quem são os jogadores mas, por ele passei a saber, e ainda vi jogos com ele mais tarde, vi jogadores, aprendi e assim estava mais próxima dele. Fiquei mesmo muito feliz porque sentia que estava a dar de mim, mas a receber bem mais, só de lembrar do riso de felicidade e espontaneo do sebas, já só quero voltar.
E assim a nossa relação se foi construindo e ele aos poucos deixava-me fazer parte do dia-a-dia dele, como eu fazia questão que ele fizesse parte do meu.
Joguei à bola uma manhã inteira com o sebas e o zé Maria, eu e o zé contra ele, coitada de mim e do zé que ou só fugiamos da bola e lá era golo - eu já só olhava para a cozinha a pensar quando é que alguém nos chama para o almoço que eu já não aguento estas corridas de lá e pra cá-, segundos com a bola nos pés, uma hora atrás do sebas, a outra alternativa também foi pôr
o zé à baliza, defendeu algumas coitado, outras o sebas continha-se e assim dava para eu recuperar, lá acabou e mais uma vez estava o sebas feliz e se ele estava eu tava pelos dois.
Já aterrei, mas ainda me lembro muito no meu dia-a-dia do sebas, faz-me falta poder cuidar de alguém que não pede, mas que precisa; faz-me falta ter pessoas à minha volta como o sebas que me transmitam que sou capaz de dar, basta saber estar; Faz-me falta o sebas só porque sei que ele vai estar ali, feliz eu sei, mas queria ter deixado ainda mais de mim.
1/08/2017
sobre o que fica
e como foi?
Foi como esperado, e melhor. Foi chegar e viver com os que lá vivem, da maneira que vivem, e conhecermo-nos melhor. Eles mais pequenos chegam primeiro aos outros mais pequenos e nós
seguimos - o xavier nunca chegou muito lá na verdade. é dos berros, não foi grande espingarda nos afetos. Conhecemos cada um, vamos sabendo das duras histórias que os levam ali e nasce uma espécie de amor e sentido de provecção por cada um. não é a primeira vez que damos conta destas realidades de crianças em risco (abusadas de várias maneiras, não obrigatoriamente sexuais), a diferença desta vez foi que partilhamos vida com eles. tomamos pequeno almoço de pijama juntos, partilhamos tarefas diárias da casa, discussões, aproximações, jogos de mesa, castigos de canto, filmes de manta, videos de youtube, as casas de banho, os guardanapos de pano (que já sabíamos de cor), garrafas de fim de ano, embrulho de presentes de reis, caça ao caramelo e tanto mais.
e no fim de tudo como se resume? resume-se a cada um, ao que fomos e ao que trazemos de cada um e que fica para sempre nosso.
Ascen- uma tranquilidade e beleza parece fazer esquecer o caos. Não entra à primeira mas quando se aproxima quer conhecer-te bem. Apaixonada pelo zé, acabou correspondido.
Sandra P.- Morenita de olhos verdes incríveis, tem personalidade bem vincada mas derrete com qualquer mendigo de rua. Agradecida pelo que lhe dão e orgulhosa do que traz. Pede zumba logo pela manhã.
Stephi - Meiga até à ultima casa e com uma vontade incrível de agradar e de os agarrar. Eles não estavam nem aí mas ela não desistia de os querer apertar e mimar. Primeira voluntária em todas as tarefas e pede de tudo para depois dar aos outros. Guapa e guapissima/o faziam parte de todas as suas frases e comentárias. Coisa querida esta miúda.
Verónika - Tanto brinca com bonecas quanto se pinta de crescida para o reveillon. tem um sorriso meigo e chorava na noite que agradecíamos termo-nos conhecida. é doce de coração mas ve-se bem que tem muito amor ainda a haver. querida verónica vais ter tempo de crescer, e vais crescer bem.
Sandra C- a mais pequena das meninas, que usa totós e gosta de ténis com ródinhas. maria rapaz que quer ser mais rapariga mas não sabe se tem coragem. Furacão de emoções quando em stress e torcidita para chamar a atenção. Foi grande amiga do manel e pediu sempre que pode e em voz alta que voltássemos, nem que seja só por isso voltaremos. (é difícil a quem já perdeu tanto na vida pedir a alguém que volte sabendo que podem dizer que não).
Borja- Menino homem que foi largado à porta de casa das irmãs com 1 ano. tem asperger mas isso não importa nada, as pancadas e rotinas dele trazem tranqilidade aos outros e isso é tão bom de se ver. não tem fritanços mas também se assusta com multidões e num dos dias que foram passear ao centro comercial todos juntos fugiu da multidão. 30/45 minutos de panico de todos e uma task force incrível entre miúdos para encontrar o querido Borja. Dormem todos melhor com ele por perto e disso não há dúvidas.
Weslin- Sorriso de parar o transito e estatura de homenzão. Pareceu-nos a nós supertranquilo e na paz, as irmãs dizem que não, pode ser que esteja a mudar. Tivemos muito pouco com ele deu ara conhecer pouco mas conquistou desde logo o difícil Xavier. no fim da passagem dos reis agradeceu às irmãs tanto presente, disse que sabia não merecer tanto -não me vou esquecer tão cedo, pode ser que esteja mesmo a mudar.
Sebas - Escolheu a tania como preferida, percebo bem, eu também a escolheria all over again. Obcecado com bandeiras de países, adora mostrar e perguntar-te se sabes de onde é. tem 32 na sua coleção que estende em cima da cama e muda diáriamente por ordem alfabética. Vê-se que é um miúdo marcada pela vida dura e passado. custa-lhe multidões e grande confusões, agarrou-se à Tanica nesses momentos e sempre que pode. (se tiverem bandeiras em pano de qualquer país do mundo, apitem e fazemos-lhe chegar).
Luis- o mini da casa o maxi a mandar naquilo tudo. é o baby com tudo o que tem direito: birras e meiguice. Gosta de ver desenhos animados ao colo e mais de jogos de tabuleiro do que de balizas. Ficou delirante de partilhar cama e quarto com eles e foram só precisos 10 minutos para se tornar intimo do manel e zé. não me vou esquecer nunca da sua voz doce a atender o telefone à mãe e dizer em voz doce e mole que tinha estado de manha a rezar por ela na missa. 7 anos de miúda vida e muita mais e melhor ainda por viver.
Sobre as irmãs a dança é outra, um nível que ambiciono também para o meu papel de mãe, amiga e até mulher:
Irene - Responsável pela casa mesmo que não lhe tivessem dado esse cargo, é matriarca natural. Culpa de tudo e solução para tudo como todas as que estão nessa posição. Sentido de humor apurado e tranquilidade do conhecer e saber o que deve ser para cada um.
Rosa - a minha homônima e avó de todos. dedicada à cozinha onde punha amor e paciência em tudo o que fazia. perguntei-lhe se sempre quis ser irmã disse-me com a maior simplicidade que sim, que adorou os 72 anos da vida que teve até agora e não parece cansada disto, antes pelo contrário.
Carmen - Querida e sorridente foi a que conhecemos menos porque foi a barcelona a uma reunião que demorou alguns dias. Estávamos lá há menos de dois dias mas antes de sair fez questão de me oferecer todo o seu armário de casacos, se fossem necessários. muito querida e doce - curioso, realizo que tenho esse sentimento de tantos que lá estavam.
Rita/ritinha - a minha doce amiga com quem tinha estado tão pouco tempo na vida mas me tinha dito tanto. e confirmou tudo e muito mais. daquelas pessoas que quando ri, ri com o coração. transporta as alegrias de todos e está sempre atenta a tudo o que se possa passar ou fazer para melhorar vidas. tem gargalhada fácil e bem alta, braços grandes e compridos para abraços únicos e um sentido de despacho ao nível de super heróis. humildade de sentimentos mas grandeza de emoções. adorei estar contigo (mais tempo que nunca) e que os meus te conhecessem de perto. que continuemos sempre assim por perto uma da outra.
e se me perguntarem como foi, foi isto. coração quente 10 dias, ainda que com temperaturas negativas do lado de fora.
Obrigada queridos amigos espanhóis por nos receberem em casa e nos darem mundo.
1/05/2017
Incrível ou não?!
Fomos comprar bilhetes para o teatro. A Rita queria ensinar uma das miúdas a fazê-lo e por isso ela conduziu a conversa. Perguntou idades mínimas, descontos de grupos, lugares e preço, tudo certinho. Demos-lhe o dinheiro e sobrava um euro de troco, recolheu os bilhetes e o talão e devolveu o troco. Dei-lhe de volta o euro, chamei-lhe taxa de serviço e ela agradeceu. Dez passos à frente havia um mendigo na rua, ela não pensou duas vezes e deu-lhe.
Stop na historia e, como nos filmes, voltamos a 1 hora antes.
Decidimos que íamos convidar a criançada a ir ao teatro, não é um programa habitual e em vez de os enchermos de presentes que não sabemos se gostariam, daríamos experiencias de vida. Ideia validada e toca a comprar bilhetes. Enfiamos-nos as três no carro em busca da bilheteira perdida - por alguma razão divina a rita não encontrava o raio do sitio onde os bilhetes estavam à venda e no meu telefone só me apareciam resultados do brasil quando procuravas patrulha canina salamanca. Voltas e mais voltas e vamos pondo a conversa em dia. A sandra (15) não percebe português e eu tenho um espanhol que coitadinho por isso basicamente falava em português com a rita e nos intervalos íamos dando uns toques à Sandra sobre cenas da vida, telemóvel uma delas como é na vida de todos os jovens. Aparentemente está sem saldo e não pode ligar ao namorado, so aceitar chamadas, tem a semanada em atraso mas ta visto que mesmo que a tivesse em dia não chegaria, precisava de mais 5 euros. Ela não reclama com isso, sabe as regras estavamos só mesmo a conversar.
Nos entretantos em português a rita perguntava-me de onde vinha o meu gosto por causas sociais, se era de nascença ou não e como achava eu que se incutia aos nossos. Disse-me que o ano anterior tinha sugerido algumas acções de voluntariado às mais velhas mas ao mesmo tempo não queria impor. Afinal elas já moram com irmãs, numa instituição e usam roupa doada, chega de razões para exclusão social. A minha opinião e que se deve deixar a sementinha disto e do resto e cresce o que tiver força e os fizer felizes. Discutíamos isto e aquilo e finalmente chegamos à bilheteira.
Voltamos ao princípio e foi mágico. Depois da conversa e, quando a vemos afastar-se para se aproximar do mendigo, olhamos uma para a outra e rimos. Grande gesto Sandrinha.
De volta à carrinha ligamos a outros dois que podiam precisar de boleia para casa e, sendo que estamos na rua, toca a saber. Outros dois entram, dois segundos depois a Ascem (14) vê da janela um sem abrigo e reclama que lhe custa ver gente a pedir nesta altura do ano com tanto frio, continuou e disse que devíamos sair à rua e dar comida a estas pessoas, a Sandra reforca ainda com um "e conertores". [Dois - zero em em menos de 15 minutos.]
Mais um sorriso entre nós e a promessa de tentar cumprir esta ideia.
Amanhã de manhã é o dia. Saímos à rua e vamos dar um lanche feito por elas às pessoas que encontrarmos na rua.
Incrível ou não?!
1/03/2017
As primeias linhas de Salamanca
12/28/2016
Doidos por chegar a ti- Rita
conheci a rita na faculdade. era uma fixe. eu não ia muito ás aulas (tanica tapa os olhos) e tinha poucos "amigos" de lá mas ela tinha qualquer coisa de mágico, sempre gostei dela.
no verão depois de ter ido fazer voluntariado a moçambique voltei às aulas em setembro e lá a encontrei de sorriso estampado: perguntou-me onde tinha andado, que estava com um ar super feliz. Contei-lhe o que tinha andado a fazer- na era em que não havia nem facebook nem instagram e as pessoas contavam as histórias ao vivo-, ela adorou o esquema. na semana que vinha seria a reunião de lançamento do ano seguinte, disse-lhe, ela ficou entusiasmada, depois disse-lhe que era um movimento católico e torceu o nariz- não era muito dessas cenas. mas arriscou, e quando achei que já tinha desistido, lá estava ela com a filipa - também da faculdade- sentada na primeira fila. foi nesse ano, e penso que no seguinte. no terceiro ficou responsável de todos os voluntários e na visita que fez ao terreno ficou em nossa casa- foi a ultima vez que a vi. já lá vão sete/oito anos.
um ano ou dois depois recebi um email dela a dizer que ia entrar numa congregação, queria ser freira. escreveu linhas e linhas de texto em que o sentimento que passava era o de uma enorme alegria e libertação. fiquei meio surpreendida e quase em choque, tinha passado algum tempo sem saber nada dela- sen dúvida que tinha. Fui ao Facebook (4 anos depois já havia) ver fotos dela numa de perceber se tinha pirado, se estava bem. Parecia estar incrível, fotos de sorrisoes era o que continuava a aparecer- tal como me lembrava nela. Escrevi-lhe de volta e foi esse o registo entre o dia desse email e os dias de hoje: eu ia sabendo noticias dela à distância e ela minhas, às vezes trocávamos mais emails sobre algumas curiosidades levantadas pelas novidades recentes.
O ano passado quisemos fugir no fim de ano para fazer voluntariado em família, não conseguimos. As possibilidades que encontramos eram muito longe e não tinhamos dinheiro para irmos todos, não queríamos deixar ninguém em terra. Falei com a rita, que vivia na colombia na altura, e ela foi uma das pessoas que me deu alternativas de projectos que adoraríamos fazer, mas longe e por isso caros.
Ela não se esqueceu disso e quando em agosto veio para mais perto, mandou-nos mensagem para a irmos visitar. Férias contadas que nem tarefeiros e não deu para irmos. O bicho ficou.
Amanhã partimos para salamanca, vamos todos ter com ela e dedicar uma semana à causa dela e que tanto queremos conhecer. A fazer a mala percebi que tou mesmo entusiasmada e até entusiasmada de a ver. Fonix quero tanto saber dela, da vida que escolheu e poder estar outra vez ao pé daquele sorrizão.
Ritinha estamos doidos para aí chegar. Cheios de mini sonhos para sonhar convosco.
Até jaaaaa
12/20/2016
O Camões Natalício
Apanhei esta pérola espalhada pela casa. Uma carta muito honesta ao pai natal e que vale a pena analisarmos, qual composição de escritor em que forma e conteúdo se unem de forma perfeita.